Quarta-Feira, 19 de Março de 2025 @
Se a experiência na entrega não for boa no digital, ela pode contaminar o consumo no dial, já que a audiência ocorre de forma híbrida
Hoje não vou focar na parte técnica, como qualidade de servidor, empresa prestadora, compatibilidade e outros pontos que já deveriam ser óbvios, mas sim no som. Sim, a qualidade do áudio no streaming. Felizmente, em mercados como São Paulo, é difícil encontrar emissoras que negligenciem essa frente, pois a maioria esmagadora das FMs executa um áudio digital de boa qualidade, respeitando as características de seus projetos e premissas. Mas, ao sair um pouco de São Paulo, em mercados grandes, com emissoras gigantes no dial, essa realidade muda em vários casos.
No FM, no dial, você encontra uma rádio impecável, com processador de última geração, entregando qualidade – o que é vital. Mas, ao experimentar essa mesma rádio no streaming, ela pode estar offline, com áudio mono ou simplesmente descompassada no volume, seja porque está muito baixo, porque há diferença entre músicas, break e locução, ou porque oscila de outras formas. Isso está muito errado. E há dados que comprovam que essa falha é grave. Vamos a eles:
Se a Kantar IBOPE Media, em meados de 2022, começou a apresentar um dado em que o streaming já era capaz de incrementar em até 35% o alcance de uma rádio top 10 em um mercado grande, já estávamos falando de algo importante. O tempo passou e esse número, nas últimas apresentações, já chegou a 54%. Ou seja, é vital. Uma eventual disputa por ranking de audiência ou liderança por formato pode ser decidida nesse detalhe. Ou pior: uma disputa mais invisível, com outras mídias, também pode ser influenciada por isso.
Vamos fazer um simples exercício: os fones de ouvido sem fio vieram para ficar, com dispositivos que entregam muita qualidade. Há um crescimento constante no consumo de áudio em smartphones, via aplicativos, sites e smart speakers. Se a experiência de som de uma rádio for inferior à de qualquer outra mídia, o ouvinte vai perceber. Pode ser algo imediato ou uma percepção construída ao longo do tempo e, como resultado final, essa rádio deixará de ser uma opção nesses dispositivos.
Pior: essa separação entre dial e streaming é percebida por nós, do meio. Mas boa parte dos ouvintes não está interessada nisso. Eles simplesmente querem ouvir a rádio da maneira mais conveniente. E uma experiência ruim no digital pode, sim, comprometer o consumo da emissora também no dial. Falo, inclusive, por experiência própria: rádios que me incomodam no streaming pela baixa qualidade exigem de mim um esforço racional para lembrar que elas são opção quando estou no dial. E, por óbvio, o contrário também se aplica: se a rádio estiver ruim no dial, ser excelente no streaming não resolverá seus problemas.
O consumo de áudio nessas duas frentes é totalmente complementar. Ouvimos onde for mais fácil pra nós. O dial, o grande campeão, é o motor de tudo. Mas o streaming já tem números suficientes para ser levado a sério pelas emissoras. Caso ainda não tenha uma audiência digital satisfatória, é possível que isso aconteça simplesmente porque a própria rádio nunca considerou essa frente como importante. E aí entram fatores como qualidade de som, conectividade, estabilidade, entre outros pontos essenciais.
Por fim, os grandes exemplos de sucesso no consumo via streaming têm vários pontos em comum. E, geralmente, isso passa pelo longo tempo em que essas emissoras consideram o áudio digital uma parte importante de suas atividades. Elas construíram essa audiência online ao longo do tempo. Basta ver que todas as rádios bem-sucedidas no streaming também são referências de audiência no dial, independentemente do formato de programação. Ou seja, uma coisa anda junto com a outra. E o ouvinte já sabe disso.
Daniel Starck é jornalista, empresário e proprietário do tudoradio.com. Com 20 anos no ar, trata-se do maior portal brasileiro dedicado à radiodifusão. Formado em Comunicação Social pela PUC-PR. Teve passagens por rádios como CBN, Rádio Clube e Rádio Paraná. Atua como consultor e palestrante nas áreas artística e digital de rádio, tendo participado de eventos promovidos por associações de referência para o setor, como AESP, ACAERT, AERP e AMIRT. Também possui conhecimento na área de tecnologia, com ênfase em aplicativos, mídia programática, novos devices, sites e streaming.