Segunda-Feira, 24 de Março de 2025 @
O rádio precisa priorizar a experiência do ouvinte, com conteúdo relevante e estratégia, e não apenas focar em vendas.
A Jornada do Ouvinte: Da Descoberta à Fidelização
Assim como o customer experience, a experiência do ouvinte deve ser encarada como uma jornada estruturada, onde cada etapa reflete a interação e o engajamento do público com a programação. No entanto, ao contrário do que se vê em outros setores, o rádio tem negligenciado essa abordagem estratégica.
Descoberta:
Nos dias de hoje, o primeiro contato com a emissora acontece de forma aleatória, muitas vezes por acaso ou indicação, diferente de anos atrás, quando o ouvinte procurava pelo rádio. Hoje, o ouvinte é bombardeado minuto a minuto por algoritmos de um mundo digital.
Mas é no momento da descoberta do rádio que a qualidade do áudio, a identidade sonora, o conteúdo relevante e a credibilidade do rádio são cruciais para causar uma impressão inicial marcante.
Experimentação e Consideração:
Após o primeiro contato, o ouvinte passa a avaliar se o conteúdo corresponde às suas expectativas e se alinha ao seu estilo de vida. Aqui reside o problema: o produto, ou seja, a programação, muitas vezes é mal preparado, com estratégias baseadas em achismos de experiências de profissionais com pensamento de rádio dos anos 70, falhando em entregar aquilo que promete.
Engajamento:
A verdadeira conexão ocorre quando o ouvinte se envolve ativamente com a emissora, seja por meio de interações em redes sociais, participação em programas ou mesmo feedback direto. Esse é o momento em que a rádio pode – e deve – mostrar que se importa com quem a escuta.
Mas atenção: mostrar que se importa não significa atender demasiadamente os pedidos musicais dos ouvintes, sem pensar numa melhor distribuição e sequência que faça sentido.
Fidelização:
Quando o ouvinte se torna um verdadeiro defensor da marca, a experiência ultrapassa a simples sintonia e se transforma em uma relação duradoura e de confiança. Essa etapa é o resultado de um planejamento estratégico que, infelizmente, está se tornando raro no setor. Tenho a impressão de que o rádio ainda não percebeu que as mídias complementares, com seus robôs – algoritmos –, vão atrás de seus usuários, enquanto o rádio ainda fica bicudo com as redes sociais ou mal faz uma ação nas ruas da cidade.
Conteúdo, Identidade e Inovação:
Para transformar a experiência do ouvinte, é indispensável que as rádios saiam da zona de conforto e encarem a realidade: vender sem preparar é um tiro no próprio pé.
Conteúdo Relevante e Autêntico:
Não basta transmitir música e notícias. É preciso desenvolver uma programação que dialogue de forma genuína com o público, entendendo suas necessidades e criando uma identidade que se destaque. Aqui, a ausência de um gestor artístico ou de conteúdo se torna ainda mais gritante, pois, sem esse profissional, a qualidade e a coerência do produto ficam comprometidas.
Você tem uma pessoa que está ouvindo e cuidando do conteúdo da sua rádio 24 horas por dia?
Interatividade e Feedback:
O ouvinte não é um mero receptor passivo. Ele quer ser ouvido, quer interagir e ver sua opinião refletida na programação. A integração com ferramentas digitais e redes sociais não é mais uma opção, mas uma necessidade para manter o engajamento ativo e real.
Mas entenda: a opinião refletida do ouvinte no ar não é veicular 30 áudios de ouvintes do WhatsApp sem edição e produção.
Consistência e Diferenciação:
Em um mercado cada vez mais competitivo, a coerência no conteúdo, na identidade da marca – desde a sonoridade até a comunicação visual e verbal – é fundamental para criar uma experiência memorável. A falta dessa consistência é um dos principais motivos pelos quais muitas rádios perdem a conexão com seu público.
Um exemplo básico: até quando as rádios vão ter os mesmos pacotes de vinhetas, trilhas e grades de programação semelhantes umas às outras?
Inovação na Experiência Auditiva:
A tecnologia pode ser uma grande aliada. Personalização de conteúdo, integração com plataformas digitais e a experimentação com novas linguagens sonoras são estratégias que podem revolucionar a forma como o ouvinte vivencia a programação. Mas, para isso, é preciso arriscar e sair do convencional.
E lembro: cuidar da qualidade do áudio, principalmente no streaming, faz parte de uma experiência auditiva. Ah, música em MP3 baixada do YouTube não dá, né?
O Descompasso Entre Vendas e Qualidade
O erro estrutural do rádio brasileiro é evidente: enquanto a ênfase é colocada na venda, o cuidado com o “produto” – a programação – fica em segundo plano. Esse descompasso resulta em uma experiência que privilegia o imediatismo das vendas em detrimento da construção de uma relação sólida e duradoura com o ouvinte, principalmente nos dias de hoje.
Falta de Planejamento Estratégico:
A ausência de um planejamento que contemple toda a jornada do ouvinte impede que a rádio evolua e se adapte às demandas do mercado atual. Investir em uma estratégia que contemple desde a descoberta até a fidelização é essencial para transformar a experiência do ouvinte em uma vantagem competitiva.
Consequências a Longo Prazo:
Uma experiência mal planejada não só afasta o público, como também compromete a reputação da emissora. O ouvinte de hoje busca autenticidade e conexão. Sem isso, a fidelização torna-se um desafio cada vez maior, e a marca perde valor de forma irreversível.
Conclusão: Repensar e Reinventar o Rádio
Chegou a hora de encarar a realidade e repensar o modelo tradicional de gestão das rádios. A experiência do ouvinte não pode continuar sendo um pensamento secundário ou uma simples consequência de vendas bem-sucedidas. Ela deve ser o centro das estratégias, a partir de um planejamento que una arte, conteúdo e inovação.
A hora de mudar é agora. Chega de pensar apenas em números e vendas. O futuro do rádio depende de uma experiência do ouvinte autêntica, estratégica e, acima de tudo, de reaproximação.
Consultor de Marketing e Professor Universitário no Curso de Administração de Empresas. Formado em Administração com Pós em Planejamento e Gerenciamento Estratégico. Foi Diretor de Marketing e Artístico da Rádio Paiquerê FM 98.9 de Londrina, Gestor de Implantação da Rede Kairós FM, além de atuar como marketing nas Rádios Folha FM 102.1 e Igapó FM 104.5 (ambas em Londrina), com passagem pela coordenação da 98 FM 98.9 de Curitiba (Grupo GRPCOM), marketing da Rádio Banda B AM 550 FM 107.1 de Curitiba, gestão artística da Massa FM 97.7 de Curitiba e de São Paulo (FM 92.9), além de Head de Digital do Grupo Massa de Comunicação.