A primeira entrevista escrita realizada pelo tudoradio.com em 2019 é com
Sergio Borsoi. O profissional é diretor técnico das rádios
89 FM A Rádio Rock FM 89.1 e Alpha FM 101.7 de São Paulo, emissoras do
GC2 (Grupo Camargo de Comunicação).
Nesta entrevista, Borsoi aborda temas como tecnologia IP, equipamentos (atualização de estrutura e necessidade de contar com profissionais qualificados nesta área), processamento de áudio, ocupação do espectro FM, internet e rádio digital.
Acompanhe!
Primeiro vamos falar um pouco do seu trabalho. Qual é, efetivamente, a sua atuação pela Alpha FM 101.7 e pela 89 A Rádio Rock FM 89.1 de São Paulo?
Atuo nas duas rádios como diretor técnico, planejando, pesquisando, especificando equipamentos de acordo com as necessidades das rádios, atendendo ampliações de serviços ou troca de equipamentos já em tempo de substituição.
Além dessas atribuições, também atuo na manutenção preventiva e emergencial nas duas emissoras. Sob responsabilidade desse departamento também está a área de TI que apesar de um departamento a parte, passam por mim as diretrizes de investimento tanto de hardware como de licenciamento de softwares.
Como você avalia, no geral, a estrutura de transmissão das rádios?
Falando um pouco de Alpha FM e 89 FM, ambas contam com equipamentos de ponta, graças a disposição de investimento dos proprietários. Ambas têm potência de operação de transmissão de 35kW mais o ganho das antenas.
Quais as principais vantagens de se contar com equipamentos e estruturas de áudio por IP?
As principais vantagens do equipamento IP são o seu baixo custo, a facilidade de cabeamento, em alguns casos, a eliminação do custo da placa de áudio e para emissoras que necessitam compartilhar fontes de áudio entre diversos estúdios facilita bastante.
E as desvantagens?
Ao contrário do que muitos podem achar, e isso é apenas a minha visão do assunto, o áudio sobre IP em nada melhora a qualidade do áudio em relação a uma mesa AES ou mesmo a uma boa mesa analógica em bom estado de funcionamento.
Também é fato que ao comprar um console de áudio hoje não se consegue fugir dos IPs.
Uma grande diferença entre as antigas mesas de áudio e as IPs é que a mesa IP não vem pronta para uso, ela tem de ser programada da maneira que o usuário imagina. As possibilidades são inúmeras e nem sempre são de fácil entendimento.
Uma mesa AES, onde as ligações entre fontes de áudio e console eram intuitivas, e apesar de muitos cabos, era fácil de planejar.
Nas mesas IP é necessário uma configuração, que nem sempre é fácil, demandando um profissional de alto nível.
Outra coisa a notar é que numa mesa não IP nunca será perdida uma configuração “por acidente”, o cabo não muda de lugar sozinho.
Outra coisa a notar é que será necessária uma segunda rede local para circulação de áudio.
Não tenho a pretensão de esgotar o assunto, só deixo a advertência de fazer uma boa avaliação antes de optar por um sistema ou por outro.
O que as rádios precisam ter em mente na hora de trabalhar com processamento de áudio?
O conceito principal do áudio é que o sistema é como uma corrente, um elo fraco estraga a corrente. Tudo deve estar alinhado desde a fonte de áudio até a antena.
Processamento de áudio não faz milagres.
Não adianta baixar um áudio mp3 da internet, todo distorcido e querer que ele soe bem no ar. Processadores são feitos principalmente para manter o nível médio de modulação da estação.
Quanto mais complexo o processador de áudio, mais qualificada deve ser a pessoa que o ajusta.
Não adianta deixar a emissora com um nível de áudio altíssimo perto das outras concorrentes e causar uma fadiga auditiva no ouvinte, a ponto que em poucos minutos ele se sinta incomodado.
Nível não é tudo. Cuidado.
Como você enxerga que está o espectro FM hoje no Brasil? Quais são os principais temas que o rádio precisa levar em consideração para preservar o FM?
O espectro de FM no Brasil está praticamente todo ocupado, principalmente nos grandes centros.
Apesar de não ser um projetista, que talvez pudesse comentar isso mais a fundo, acredito que a preservação está na manutenção dos transmissores dentro das especificações de potência, local de instalação e controle de emissões espúrias, o que permite que o Plano Básico de Alocação de Frequências funcione como previsto.
Outra coisa é o controle das rádios clandestinas, que são cada vez em maior número e cada vez de potência maior.
E no mercado do interior do Brasil? Como você vê a estrutura das rádios em relação a transmissão e processamento de áudio?
Interior é um conceito muito relativo, prefiro falar em pequenos mercados.
O Brasil conta hoje com bons fabricantes de antenas, transmissores e processadores de áudio, capazes de levar ao ar um excelente áudio, principalmente considerando os mercados menos competitivos.
Qual é a importância de uma rádio ter um profissional especialista nessa área?
Mal comparando, qual a importância de um cardiologista e por que o consultar em vez de um farmacêutico?
Você faria um investimento importante na estação e entregaria a uma pessoa desqualificada para instalar e ajustar?
Dinheiro jogado fora, ainda mais hoje que os equipamentos são bastante complexos.
Como rádios que contam com mercado mais restrito podem se atualizar nessa área?
Certamente a consultoria técnica é um caminho para quem não pode pagar um profissional extremamente qualificado.
Importante é "ter o sapato do número certo".
Sem menosprezar nenhuma empresa, não adianta investir uma tecnologia complicada se não vai ter ninguém para manejar.
É preferível ter um equipamento mais simples que atenda no momento com a qualidade esperada, mas de uma tecnologia básica.
Como o mundo digital (aplicativos, portais, streaming) podem contribuir para o fortalecimento do rádio FM?
Acho que são meios de transmissão complementares, mas hoje eles só sobrevivem por causa da emissora. Acredito que se tirar os transmissores do ar os meios alternativos morrem.
A internet tem um número inimaginável de pessoas tentando ganhar dinheiro, e quantas realmente conseguem?
Se ninguém contar ao ouvinte que existe o site da rádio como ele iria achar na sopa de letrinhas da internet?
Acho que não pode ser ignorado o mundo digital de maneira alguma, mas hoje ele é complementar ao rádio.
Há uma retomada das intenções de se contar com um modelo de rádio digital no Brasil? Que tipo de possibilidade isso pode gerar para o FM?
Não vejo esse movimento acontecendo com vigor.
O que isso poderia trazer, caso fosse adotado o modelo digital híbrido na banda de FM, seria o surgimento de outras 3 programações por emissora, o que também geraria custos adicionais de produção e que nem sempre o radiodifusor está disposto a ter.
Sobre a qualidade do áudio, não vejo grande diferença de uma boa transmissão analógica.
Hoje o FM analógico bem feito tem uma excelente qualidade.
Não é a mesma coisa de compararmos a TV analógica com a digital, caso esse em que a mudança foi gritante para o telespectador.
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tecnologia IP, transmissão, FM, equipamentos, espectro, rádio digital, internet