A Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados, discutiu nesta semana, em Brasília, o excesso de projetos de leis que destinam horários em rádios e TV para a divulgação de mensagens obrigatórias fossem aprovados no Congresso. O “estrangulamento” da grade de programação das emissoras colocaria em risco a sobrevivência da radiodifusão aberta no país, que tem na publicidade sua principal fonte de recursos. De acordo com os membros da comissão, o rádio e a televisão teriam pouco mais de cinco horas para veicular conteúdo próprio caso todos os projetos de lei que destinam horário gratuito para a divulgação de mensagens obrigatórias fossem aprovados no Congresso.
Essa foi uma das conclusões dos debatedores da audiência pública sobre o tema na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados, nesta terça-feira, 27, em Brasília. Atualmente, 39 projetos da Câmara e quatro do Senado tratam de cessão obrigatória de mensagens de alerta sobre os mais variados temas, que vão desde menores desaparecidos, exploração sexual, preservação do meio ambiente, combate à AIDS, consumo sustentável de água e até vestuário confeccionado com pele de animais.
Somados aos que já foram arquivados, tomariam dez horas e 13 minutos da programação das emissoras todos os dias. Na opinião do advogado e ex-ministro da Justiça e do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, o debate não deve girar em torno do mérito do conteúdo das campanhas sociais, mas do meio em que elas devem ser veiculadas. O artigo 223 da Constituição prevê a concessão de radiodifusão pelo Executivo observando o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal, explicou.
“O caminho do privado é o melhor? A radiodifusão tem uma série de obrigações, é um setor fartamente regulado. Se houver um minuto para um setor da sociedade, tem que haver outro minuto para outro setor. Estamos aí em um caso de inconstitucionalidade”, afirmou. “Qual critério os senhores utilizariam para aprovar a divulgação de mensagens sobre crime de exploração sexual ou sobre a necessidade de se utilizar vestuário que não utilize pele de animais?”, questionou.
Ele propôs a criação de grupo de trabalho para examinar a questão e encontrar uma solução “equilibrada” para resolver o problema do excesso de proposições isoladas, sem deixar de considerar a legitimidade da veiculação dessas mensagens.
Para o assessor jurídico do Ministério das Comunicações, José Flávio Bianchi, a interferência no conteúdo das emissoras por meio dessas propostas criaria um impasse de ordem constitucional. “Há garantia na Constituição de que não deve haver embaraços na livre manifestação e de expressão. O grande desafio é encontrar o equilíbrio e fazer análise do impacto desses projetos, que não devem comprometer a viabilidade e a autonomia das emissoras”, disse.
Diferentemente de países da Europa, que investem na radiodifusão estatal por meio de subsídios governamentais e de impostos, o sistema de rádio e TV brasileiro é eminentemente privado, observou o presidente da Abert, Daniel Slaviero. Nem por isso as emissoras deixam de reconhecer o seu papel social, por exemplo, com a cessão espontânea de espaços publicitários para campanhas educativas, abordagens de temas socialmente relevantes em novelas, programas de auditório e de jornalismo, afirmou Slaviero.
“Se esses projetos fossem aprovados de forma isolada, o papel social da TV e do rádio estaria totalmente inviabilizado. A nossa preocupação é a de que a edição excessiva de obrigações por meio dessas propostas de lei possam desestimular as rádios e as TVs que já fazem esse trabalho espontaneamente ”, declarou. Um dos exemplos mais notáveis dessa iniciativa, segundo ele, foi contabilizado pela associação que representa a radiodifusão comercial no Rio Grande do Sul. Em 2011 as emissoras do estado cederam R$ 74 milhões em espaços para ações de causas sociais e de interesse da comunidade.
O presidente da Abert lembrou das atuais exigências que as emissoras já devem cumprir. A veiculação de cinco horas semanais de programas educativos, o limite de 25% para publicidade, os programas partidários e a veiculação do programa A Voz do Brasil, por exemplo. Somadas a outras obrigações, as emissoras têm pouco menos de 60% para veicular o seu conteúdo.
Ele concordou com a ideia do ex-ministro de equilibrar as obrigações entre os diferentes sistemas de radiodifusão público, estatal e privado. “Seria uma boa saída que essas mensagens fossem publicadas no meio público e deixasse a livre iniciativa para operar com sua total capacidade, com suas ações voluntárias. Além do que já cumprimos com uma série de determinações legais”, disse.
“As concessões são onerosas e existe todo um conjunto de compromissos tanto do poder concedente quanto dos radidifusores”, afirmou o deputado Arolde Oliveira (PSD-RJ), autor do requerimento para a audiência pública. Ele propôs a criação de um espaço único “razoavelmente aceitável” e que neste tempo fosse feito um rodízio dos alertas mais importantes. “Seria um mecanismo para não entrarmos numa questão que considero ilegal, inconstitucional, de quebra de contrato”, afirmou.
Assessoria de Comunicação da Abert
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